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“Já basta de preto!”

O racismo é cruel com todos e perverso com as crianças

“Já basta de preto!”

Foto: Reprodução/ IA Canva

Chegou o mês da Consciência Negra. Em novembro, um dia é dedicado à reflexão sobre a importância e contribuição dos povos africanos e afrodescendentes para a história, cultura e identidades brasileiras. Em algumas capitais, esse dia é considerado feriado.

Mês que, nos planejamentos das ações em escolas, empresas e instituições em geral, estão presentes atividades que contemplam a pauta da conscientização pelo respeito às pessoas negras. Normalmente para um único dia, sendo que essa sensibilização deveria ser reconhecida como urgente e permanente.

Destemidamente, a cada semana a coluna se dedicará a recomendar temáticas aos educadores e educadoras, para que estes possam incrementar suas metodologias de ensino nesses quase 20 dias letivos do mês.

Dessa forma, o preconceito racial no ambiente familiar será nossa primeira sugestão.

A discriminação racial no ambiente familiar, bem como no escolar, pode afetar a autoestima e a formação da identidade das crianças e jovens pretos e pardos. O combate ao racismo começa em casa.

O racismo é cruel com todos e perverso com as crianças. Entre outras coisas, impede que as crianças se sintam bonitas e até não se sintam amadas.

Em um momento de conversa com a mãe de uma criança, a mesma comentou que o pequeno estava com a pele muito queimada, devido à exposição ao sol forte que estamos presenciando em Manaus proferindo a seguinte frase: “Tá ficando é preto. Pode não, de preto lá em casa já basta tua avó!”.

Nessa frase, é possível perceber o desejo de embranquecimento na família, característico do racismo estrutural impregnado em nossa sociedade. Consolida-se na fala da mãe, a negação da origem familiar, de toda uma ancestralidade.

Ainda, se torna perceptível a visão inferior em relação às pessoas negras que aquela mãe tem e que, com sua fala, repassa essa concepção à criança, que naturalmente vai reproduzi-la no seu meio social.

O fato é que pais, mães e responsáveis, muitas vezes, não sabem lidar com o cabelo crespo ou cacheado das crianças. Alguns simplesmente se desesperam, reproduzem o racismo, não enxergam seus filhos como pretos ou pardos, não valorizam sua afrodescendência.

Semanas atrás foi divulgada, em veículos jornalísticos, uma notícia de que um menino negro desistiu de iniciar uma carreira como modelo, justificando o abandono do sonho afirmando: “Pra quê? Pra ser chamado de macaco?”.

Muitas crianças e jovens crescem odiando suas características físicas, desistem dos seus desejos, não são encorajados a acreditar que podem sonhar.

Seus conceitos e gostos desprezam a estética negra o que os leva a atitudes muitas vezes prejudiciais à própria saúde física.

Quanto à saúde mental? Os estragos são profundos, abalam a formação da personalidade e moldam comportamentos negativos em relação a si, aos outros e ao mundo.

Quando se tornam adultos costumam traçar estratégias de fuga como procedimentos estéticos, usar os cabelos curtos, cortados ou aderir a tratamento capilar com processos químicos como relaxamento, alisamento e com as tais escovas progressivas.

Essa preocupação levou o professor Pervirguladez, educador de crianças do ensino fundamental da rede pública do Estado do Rio de Janeiro, a produzir um material musical chamado de MPBIA – Música Popular Brasileira Infantil Antirracista.

As canções podem ser encontradas no canal do YouTube @omeucabeloebembonito.

O movimento de conscientização neste novembro, no espaço mais importante para a formação de uma sociedade justa, que é o espaço escolar, pode favorecer a desconstrução de algumas inverdades que ainda estão no inconsciente coletivo sobre os marcadores físicos da raça negra, visto como fora dos padrões estéticos.

Em uma escola pública que lecionei, aqui em Manaus, existe um projeto da Semana da Consciência Negra. Nesses dias, várias atividades de conscientização com as crianças e famílias são realizadas, inclusive os familiares são convidados a ir à escola almoçar uma deliciosa feijoada.

Já existe um esforço isolado de alguns professores e professoras, conscientes da importância das ações e práticas antirracistas nas suas instituições de ensino.

São guerreiros que buscam espaço para pensar projetos comprometidos com a desconstrução desses estereótipos corporificados na inconsciência social brasileira.

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1 Comentário

1 Comentário

  1. Paulo Eduardo Braz dos Santos 02/11/23 - 21:51

    Ótimo texto. De fato, o racismo é estrutural e está empreguinado em nossa sociedade. Romper essas estruturas impostas não é fácil, mas necessária para nossa evolução enquanto humanidade.

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