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Welton Oda

Precisamos falar sobre a raiva

Compreender a naturalidade da raiva e saber o que fazer com ela é um passo muito importante

Precisamos falar sobre a raiva

Foto: Norte em Foco

Todo mundo sente raiva, em algum momento, alguns mais, outros menos, normal. Uma das minhas raivas tem, como não poderia deixar de ser, uma dose de preconceito. Tudo bem, afinal, como diriam Rita Lee e Chico César na música “Odeio rodeio” “eu sei que é preconceito, mas ninguém é perfeito, me deixe desabafar…”.

Eu tenho certa raiva dessa galera muito zen, muito não-violência, que “dá a outra face”, coisa e tal, porque fazem parecer que a raiva, um sentimento natural é algo nocivo, ruim, que a gente deve se envergonhar de sentir. A raiva cumpre um papel muito importante e, para falar sobre isso, vou começar com as palavras do velho Paulo Freire. O educador pernambucano diz assim: “Está errada a educação que não reconhece na justa raiva, na raiva que protesta contra as injustiças, contra a deslealdade, contra o desamor, contra a exploração e a violência um papel altamente formador.” Malcolm X também alerta para que não confundamos a reação do oprimido com a violência do opressor.

Todo mundo anda muito bonzinho, muito apático, muito medroso. Os ricos deveriam nos temer, mas a gente não anda ajudando. O jornalista Ricardo Boechat também dizia estranhar que, no Brasil, ninguém joga ovo em político, ninguém risca carro de autoridade, como fazem os argentinos. Por aqui andamos “com a bunda na janela pra passar a mão nela”, como diria o Gonzaguinha.

Compreender a naturalidade da raiva e saber o que fazer com ela é um passo muito importante. Primeiro falemos sobre o que não fazer com ela, novamente recorrendo a Paulo Freire: “o que a raiva não pode é, perdendo os limites que a confirmam, perder-se em raivosidade que corre sempre o risco de se alongar em odiosidade”.

Assim, uma coisa é a raiva imensa que uma criança palestina sente de soldados israelenses que torturaram e mataram seus pais, que humilham seus tios nos postos de vigilância em Gaza. Outra coisa é o ódio insensato, frio e calculista dos israelenses que, não sendo oprimidos pelos palestinos, querem exterminar toda a sua população.

No Brasil, é igualmente natural sentir raiva de bolsominions, depois do rol interminável de maldades que perpetram contra minorias das mais diversas. Aliás, os bolsominions são um combo de preconceitos, ignorâncias e ódio. Assim, muito embora diversos destes autodenominados “patriotas”, “cidadãos de bem”, tenham assassinado LGBTs, pessoas em situação de rua, gente de esquerda, mulheres, raramente uma destas criaturas abomináveis e odiosas são incomodadas, agredidas ou violentadas. Essa é a diferença entre ódio, um sentimento perverso e estúpido, e raiva, uma reação natural a uma injustiça, uma perversidade.

Que nossa raiva nos faça reagir, sempre! Que a bem-vinda raiva às tremendas desigualdades sociais nos conduza a transformá-las, a nos inquietarmos! Que nossa raiva nos ajude também a desmontar essa bomba-relógio que o ódio bolsonarista dissemina. Que nossa raiva ao bolsonarismo nos ajude a fazer a grande ficha cair para a maioria do povo brasileiro e que, cientes do tamanho da monstruosidade que representa essa ideologia de extrema-direita, daqui a alguns anos, a palavra bolsominion torne-se, na língua portuguesa, de forma consensual, o pior xingamento, sinônimo de chorume humano, de escória, podridão moral, degeneração humana, perversidade, inutilidade, que todo brasileiro compreenda que ser chamado de bolsominion é o mesmo que ser chamado de nazista, que os filhos e netos destas pessoas sintam vergonha deles e que nenhum jovem queira ser confundido com um, ter amizade com eles, que nossa raiva nos livre desse tipo de gente.

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