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Victor Araújo

Desvincular o orçamento: um possível golpe no financiamento dos direitos sociais

Pressão do mercado reacende o debate sobre desvincular o Orçamento, ameaçando o financiamento de direitos sociais e ampliando a influência parlamentar sobre recursos

Desvincular o orçamento: um possível golpe no financiamento dos direitos sociais

Foto: IA

A Constituinte não apenas garantiu direitos sociais, garantiu também seu respectivo financiamento, e é isto que está em jogo, dada a pressão da Faria Lima por mais cortes de gastos primários, que fez ressurgir o debate sobre desvincular o Orçamento da União.

Antes de tudo é preciso esclarecer o que são as vinculações presentes no orçamento brasileiro. A Constituição Federal (CF) prevê mecanismos importantes para garantir uma mínima destinação de recursos aos serviços públicos que asseguram os direitos sociais nela inscritos, isto é, basicamente, a vinculação orçamentária.

Existem duas principais formas de vinculação:
1. Os pisos mínimos de investimentos, como no caso da saúde, que, como prevê o §2° do Art.198, tem um piso de 15% (no âmbito da União) da Receita Corrente Líquida (RCL). E da educação, que tem um piso de 18% (Também no referente à União) da Receita de impostos, como prevê o Art.212. e;
2. A criação de tributos exclusivamente dedicados a financiar direitos sociais (Art.195), são as chamadas contribuições sociais, como a Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL).

Ao inserir estes pisos na CF, os constituintes criaram travas para dificultar que o Executivo e o Congresso da vez pudessem reduzir drasticamente o montante destinado às áreas tão essenciais. Além de tentar evitar que houvesse variações negativas crescentes ao longo dos anos para o financiamento delas.

Um fantasma que tem retornado incessantemente ao debate econômico é a “necessidade” de desvincular o orçamento, para, supostamente, permitir maior flexibilidade na gestão orçamentária e uma redução das despesas primárias a níveis suficientes para gerar superávits primários.

São muitos os problemas desta análise, mas aqui irei comentar apenas sobrea problemática de ignorar os pressupostos constitucionais que regem o Orçamento e as dificuldades que seriam amplificadas pela parlamentarização crescente no orçamento federal.

Os defensores da desvinculação citam como fato a ideia de que os direitos previstos pela CF não cabem no orçamento, um completo absurdo.
Primeiro, porque na democracia inexiste orçamento público fora da Constituição, sob risco de, ao enfraquecer a materialização de suas promessas, degenerar o pacto civilizatório feito pela Carta Magna.

Segundo, porque ao levantar a hipótese de cortar gastos primários essenciais para gerar superávits subvertem o §10, Art.165, que garante que o orçamento primário discricionário deve priorizar a entrega de bens e serviços à sociedade. No caso das contribuições sociais, anulam-se os motivos para sua existência, visto que, neste caso, a tributação existe única e exclusivamente para financiar as despesas às quais é vinculada.

Também preocupa o contínuo avanço do Congresso sobre o Orçamento Federal. Com uma possível flexibilização extra nos pisos, seria necessário ainda mais esforço para impedir que o Congresso abocanhe estes recursos, hoje protegidos pelas vinculações constitucionais.

A pulverização excessiva (na forma de emendas parlamentares) dificulta a devida fiscalização sobre os recursos, além de impedir uma estratégia planejada e organizada de investimentos.

Desde 2016, o Congresso tem aumentado o número de emendas impositivas no orçamento. Na LOA (Lei Orçamentária anual) de 2025 esse problema segue intacto, visto que os congressistas, à revelia de decisões do STF, mantiveram 50 bilhões em emendas parlamentares, quase 17% do orçamento discricionário total. É preciso questionar se, em um momento em que o presidencialismo de coalizão brasileiro tem se degenerado em um parlamentarismo orçamentário, é adequado discutir o fim de balizas constitucionais tão importantes ao financiamento de direitos fundamentais.

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1 Comentário

1 Comentário

  1. Anna 30/03/25 - 12:00

    Arrasou. Que coluna bem escrita e explicada!
    O Victor sempre arrasa! ????????

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