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Qual é a sua cor?

A educação é capaz de promover a valorização da nossa afrodescendência

Qual é a sua cor?

Foto: Reprodução/ Canva

Na semana passada, a filha do cantor Michael Jackson afirmou se identificar como uma mulher negra. Paris Jackson tem a pele branca e os olhos azuis.

Para nós, aqui no Brasil, essa afirmação pode soar como sem nenhum sentido. Na sociedade brasileira, a posição social que uma pessoa ocupa e a forma como ela é tratada na sociedade, costuma ser definida pela cor da pele, cabelos e outros marcadores raciais.

Nos Estados Unidos, onde vive a herdeira de Michael, o sangue conta para uma pessoa se considerar negra. A origem da família é fortemente considerada na autoidentificação de pessoas negras. A cor da pele, dos olhos, cabelos e outros fatores biológicos pouco importam.

No Brasil não funciona assim. Os aspectos fenotípicos são fatores decisivos de identificação e inserção social. Quanto mais pigmentada uma pessoa, mais exclusão e discriminação essa pessoa irá sofrer.

Por exemplo, em uma entrevista televisiva com um rapaz negro, que estava na estação de metrô, em São Paulo, o jornalista Rodrigo Bocardi, homem branco que frequenta um clube de tênis de elite, perguntou se o menino era um dos que ficavam na beira da quadra pegando as bolinhas quando ele está jogando tênis no clube.

O rapaz, de pele negra de tom claro, respondeu que não, que ele era um atleta de pólo aquático e treinava no clube. Ou seja, por simplesmente ver que era um jovem negro, o repórter já o havia colocado em uma posição de servidão, sem nem sequer indagar o porquê de o menino estar indo ao clube.

Essa situação, muito corriqueira no cotidiano, ilustra o preconceito existente na sociedade brasileira, que foi levada a naturalizar a presença de pessoas negras em lugares associados ao trabalho servil e submisso.

Para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, 55% da população brasileira é negra. O órgão considera negro ou negra, as pessoas que se autodeclaram pardas ou pretas. Logo, de acordo com a classificação populacional do IBGE, mais da metade dos cidadãos brasileiros são negros.

Essa é uma discussão conhecida pelo movimento negro como colorismo. Este termo surgiu por causa das diferentes tonalidades de pele negra, tons mais claros e tons mais escuros.

A formação de nossa sociedade se deu pela mistura de raças, a indígena, a negra e a branca europeia dos colonizadores. Somos um povo miscigenado. O brasileiro não tem um tipo físico padrão, um arquétipo brasileiro. Temos variados tons de pele.

A preocupação com a identidade do povo brasileiro surge após o fim do período escravagista, no iniciar do século XX. O Estado, influenciado pelo capitalismo e pela industrialização que chegava, passou a se preocupar com a imagem do país diante das nações colonizadoras e investidoras.

Iniciou-se a tentativa de eliminação do elemento negro, que na visão da elite intelectual e financeira, sujaria a imagem brasileira diante do mundo. Assim, criaram-se políticas públicas de imigração de europeus, que foram contemplados com moradia, terra e incentivos para morar e trabalhar no território brasileiro.

Ainda como parte dessa limpeza para iniciar a construção identitária brasileira, os ex-escravizados, ainda que libertos, não tiveram direitos assegurados, nem ações governamentais de inclusão e cidadania. Pelo contrário, foram empurrados para a margem, nos guetos, favelas e regiões recônditas, relegados à pobreza, opressão e exclusão.

Em uma pesquisa realizada pelo instituto Inteligência e Pesquisa e Consultoria Estratégica – Ipec, em julho de 2023, 81% dos brasileiros têm a percepção de que o Brasil é um país racista, 60% concordam totalmente e 21% concordam em parte.

A iniciativa, intitulada “Percepções sobre o racismo no Brasil”, é uma colaboração entre o Peregum (Instituto de Referência Negra) e Projeto SETA (Sistema de Educação por uma Transformação Antirracista).

Se somos a maioria de negros, por que somos racistas?

Porque nós não nos identificamos com a cultura, com a história, costumes da descendência africana que temos. Crescemos sendo ensinados, nos espaços escolares e midiáticos, com pessoas negras sendo retratadas de forma pejorativa, inferiorizada e negativa.

Não temos uma identidade nacional forte e reconhecida de forma positiva por nós mesmos nem pelo mundo. Porém, essa ideia não se deu por culpa do povo brasileiro, pois isso foi e ainda é um projeto de dominação e manutenção de poder de uma camada social, branca, de costumes aristocráticos, coloniais e detentora de privilégios.

O colorismo, que pode ser chamado também de pigmentocracia, dificulta esse reconhecimento de identidade nacional. Torna-se essencial dizer às crianças e jovens brasileiros que temos tons de peles diferentes por ocasião da mestiçagem ocorrida no Brasil, que a nossa origem é africana e nossos ancestrais foram fundamentais na nossa constituição cultural e histórica enquanto nação.

Considero que a educação é capaz de promover a valorização da nossa afrodescendência, permitindo que as gerações futuras transformem as estatísticas sociais e apontem uma nova visão de identidade nacional, com mais pessoas reconhecendo-se como negras e negros, diminuindo o racismo estrutural em nossa sociedade.

 

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2 Comentários

1 Comentário

  1. Jennifer melo de Oliveira 09/09/23 - 10:26

    Maravilhosa que texto hein Dona fanu…rum arrasa muié

  2. Norma Veras 09/09/23 - 11:54

    Excelente tema, é um descalabro em pleno século XXl, ainda existir preconceito.Eu classifico pessoas preconceituosas, como desinformadas e ignorantes, nada menos que isso.

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