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O que foi isso, companheiro?

A invisibilização da questão racial e/ou a sua negação foi uma estratégia histórica das classes dominantes brasileiras para manter seus lugares de poder

O que foi isso, companheiro?

Foto: Reprodução/ Canva

Nas redes sociais, diversos internautas, bem como a imprensa brasileira, têm cobrado o Movimento Negro para manifestar repúdio em relação a uma fala do presidente Lula, em uma visita a Cabo Verde, na África.

Alguns dizem que estamos ignorando essa equivocada fala do estadista: “Nós, brasileiros, somos formados pelo povo africano. Nossa cultura, nossa cor e nosso tamanho são resultado da miscigenação de índios, negros e europeus. E temos uma profunda gratidão ao continente africano por tudo que foi produzido durante 350 anos de escravidão no nosso país”.

De primeira, olhos já apropriados do contexto do chamado Letramento Racial enxergam expressões que precisam ser abolidas do nosso vocabulário cotidiano, como índios e escravidão. Mas essa é outra conversa.

Aqui chamo a atenção para a ausência desse entendimento, não só por parte dos representantes da democracia, mas também por cada um de nós.

Letramento é uma expressão compreendida pelos estudos pedagógicos como o resultado da ação de ler e escrever, em que os sujeitos aprendem essa prática, a fim de poderem interagir e agir nos mais diversos contextos sociais.

A criança pequena aprende a ler e escrever a palavra, mas também é preciso que ela compreenda em qual situação a palavra está presente para que haja o total e concreto reconhecimento da linguagem.

No Letramento Racial, aprende-se a ler as questões raciais no contexto brasileiro. O racismo, que se faz presente nos quatro cantos do país e nas nossas relações diárias, tem uma origem, um porquê, uma manutenção.

Para um governo que contempla as questões de raça em suas agendas e ministérios, já era para termos um presidente e suas equipes letrados racialmente.

Somente depois desse episódio, foi divulgado que seria contratada uma consultoria antirracista para orientar os discursos do dirigente do país que tem mais pessoas negras no mundo, fora dos países africanos.

No Brasil, o racismo é estrutural, ou seja, sua existência independe do fato de ser intencional ou baseada em preconceitos individuais. Está presente na sociedade, se estrutura na linguagem e no discurso, nas nossas palavras e atitudes do dia a dia.

Os negros africanos foram trazidos para cá num grande esquema de tráfico humano, para serem escravizados. Mulheres negras foram objetificadas e reduzidas a objetos sexuais e amas de leite.

Eram inferiorizados e não eram considerados humanos. Acreditava-se, entre outras teorias absurdas, que eram mentalmente inferiores aos brancos.

A invisibilização da questão racial e/ou a sua negação foi uma estratégia histórica das classes dominantes brasileiras para manter seus lugares de poder – e é até hoje.

Por essas e outras, que a temática precisa estar nas universidades, escolas, imprensa, movimentos sociais, espaços culturais, e deve ser permanente, a fim de que ocorra uma reeducação das relações étnico-raciais e, consequentemente, maior valorização e entendimento sobre a verdadeira “produção” que ocorreu na formação, história e cultura do povo brasileiro, desde os mais de 3 séculos de escravização.

Enquanto parte do Movimento Negro, com essas palavras, deixo aqui, pedagogicamente, o meu repúdio. E que a equipe que o governo anunciou que iria contratar se alinhe com o novo projeto de sociedade defendido pelo movimento da negritude brasileira.

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