
Proposta prevê demarcação de territórios segundo ocupação de 1988 e divide indígenas e agronegócio
Brasília – O Senado Federal aprovou, em dois turnos realizados de forma expressa nesta terça-feira (9), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 48, que institui o marco temporal para a demarcação de terras indígenas. O texto, que agora segue para análise da Câmara dos Deputados, inclui na Constituição a regra de que os territórios só podem ser reconhecidos se estavam efetivamente ocupados pelos povos originários em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Carta Magna. A medida é uma vitória histórica da bancada ruralista e um duro golpe para os movimentos indígenas, que rejeitam a tese.
A tramitação foi acelerada por um calendário especial, aprovado horas antes, que permitiu a votação em dois turnos consecutivos – desrespeitando o regimento que exige intervalo de cinco sessões. A manobra reflete a tensão institucional entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), que tem o marco temporal em pauta de julgamento nesta quarta-feira (10). No primeiro turno, a PEC teve 52 votos a favor e 14 contra; no segundo, 52 a 15.
Conteúdo do relatório aprovado
O relator, senador Esperidião Amin (PP-SC), apresentou um novo texto já com a sessão em andamento. Além de consolidar o marco de 1988, o relatório:
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Veta a ampliação de terras indígenas além dos limites já demarcados;
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Prevê indenização a proprietários rurais, inclusive a posseiros, em caso de desapropriação – até mesmo para áreas de “terra nua” (nunca exploradas);
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Garante participação de estados, municípios e dos próprios fazendeiros em todo o processo de demarcação, hoje conduzido por órgãos indigenistas com base em estudos antropológicos.
Contexto de guerra institucional
A votação ocorre em meio a um clima de confronto entre os Poderes. Na semana passada, o ministro Gilmar Mendes, do STF, decidiu monocraticamente retirar do Congresso a prerrogativa de abrir processo de impeachment contra ministros da Corte, restringindo-a à Procu-Geral da República. Em retaliação, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pautou uma série de projetos sensíveis ao Supremo, incluindo o marco temporal.
A PEC é uma tentativa de “blindar constitucionalmente” a tese. Em 2023, o STF já havia julgado o marco temporal inconstitucional. O Congresso, então, aprovou uma lei ordinária com a mesma regra, mas sua validade ainda é questionada na Corte. Incluí-la na Constituição tornaria muito mais difícil para o Supremo derrubá-la.
Próximos passos e reações
Agora, a PEC segue para a Câmara dos Deputados, onde a bancada ruralista é ainda mais forte e sua aprovação é considerada provável. Se alterada, volta ao Senado. Enquanto isso, o STF retoma o julgamento do tema nesta quarta, em um cenário de crise institucional aguda.
Lideranças indígenas e organizações da sociedade civil já classificaram a aprovação como um “retrocesso civilizatório” e uma “legalização da grilagem”. O agronegócio, por sua vez, celebra a medida como segurança jurídica para a produção. O desfecho dessa batalha definirá o futuro de milhares de processos de demarcação e de quase 11 mil requerimentos de mineração que incidem sobre terras indígenas.
(*) Com informações do portal ICL Notícias
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